Networking (o verdadeiro)

Depois de quase 30 anos no mercado de tecnologia e inovação, e tendo passado por todos os tipos de empresas, desde pequenas startups brasileiras até gigantes globais como a HP, posso afirmar:

Networking não existe.

Pelo menos não aquele networking que todo mundo imagina:

  1. você conhece pessoas no trabalho,
  2. desenvolve relacionamento com elas,
  3. elas percebem valor naquilo que você faz,
  4. elas te chamam para trabalhar com elas ou ajudam te indicam para outras pessoas que veriam valor no seu trabalho.

O que realmente ocorre é o seguinte:

  1. você conhece pessoas no trabalho,
  2. desenvolve relacionamento com elas, percebe que há vários grupos políticos disputando poder dentro da empresa,
  3. você tenta descobrir seu espaço dentro desses grupos e faz escolhas, aproximações,
  4. se você conseguir ser aceito pelo grupo, você fica na empresa. Se não conseguir, darão um jeito de te trocar por outra pessoa de perfil mais adequado para o grupo. Alguns chamam isso de fit.
  5. recomendações e indicações feitas pelos seus (ex)colegas ao mercado vão depender da memória que eles têm do seu fit político.

É claro que se você é técnico e um bom “resolvedor de problemas”, será lembrado e indicado. Talvez seja a única exceção onde o networking é verdadeiro e honesto.

Se você é um people person, um líder, um gerente etc. valem as definições acima. Sua inteligência social na hora de jogar o jogo político será fundamental para o desenvolvimento de um networking funcional.

Você será sempre lembrado pelas suas atitudes diante de problemas, crises e, principalmente, nas disputas entre os grupos políticos.

“Vestir a camisa da empresa” significa que você joga o jogo político de acordo com as expectativas do grupo dominante.

— “Estou colocando estes 20 pedidos para vocês e prometi para os clientes que estaria tudo entregue na semana que vem, ok?”

— “Mas a gente não trabalha assim. Você sabe. São de 6 a 8 pedidos por semana, e já temos 4 na linha. Podemos te entregar 2 e você põe 20 com promessa para a semana que vem? Isso vai acabar com a nossa moral com o cliente.”

— “Falei com [líder do grupo político dominante] ontem. Ele autorizou.”

Neste ponto o networking do vendedor que “veste a camisa da empresa” está perfeito para o diretor que autorizou o lote de pedidos que colocará em risco o pós-venda da empresa.

Por outro lado, o mesmo vendedor nunca será associado a boas memórias junto ao pessoal de pós-venda. Nunca poderá pedir a eles uma ajuda ou indicação, pois quem indica alguém, o faz para ajudar um amigo, não para prejudicá-lo.

Perceba que o motivo da tensão é muito nobre: vendas. Mais vendas. 10 vezes mais do que a empresa suportaria normalmente.

O que provocou isso? Oportunidade no mercado? Timing comercial? Ou pressão e um líder muito preocupado com seu bônus, porém displicente com a capacidade da empresa de honrar seus compromissos com clientes?

Pense bem. Questione-se sempre sobre suas decisões e caminhos dentro da empresa.

Pense bem em qual time você quer jogar; ele pode ser seu primeiro ou último.

Foto de capa: Quino Al via Unsplash